sexta-feira, 24 de outubro de 2008

M A R I N A


Um amigo sugeriu que eu tentasse escrever um conto curto ao mesmo tempo em que escutasse alguma música que não gosto. A idéia era despertar a criatividade através do improvável e deixar o texto correr. Escolhi a sofrível Goodbye my lover, do James Blunt, e coloquei em "repeat" no Media Player. Quando o primeiro parágrafo saiu, acho que já havia escutado a música mais de dez vezes. Uma tortura fodida. Os parágrafos seguintes foram escritos no silêncio... segue o resultado: um conto curto chamado Marina.

--------------------------------------------------------------------------------

O sal rachava os lábios rúbidos de Marina. Cada sopro do vento hostil levantava o vestido rasgado e desnudava suas coxas pálidas. Marina permanecia inerte, com os pés dormentes afundando na areia e olhar fixo na ilha em forma de baleia. As gotas d’água que saltavam do mar encontravam seu rosto sardento e escorriam em direção à sua boca, confundindo-se desgostosas com as lágrimas salgadas.

No início do crepúsculo, o dedão do pé direito descobriu as costas lisas de uma concha e empregou-lhe uma massagem letárgica. Enquanto isso, a maré enchia apressada e a canela de Marina desaparecia progressivamente na areia encharcada a cada refluxo do mar verde, cor de limonada. Os movimentos de seu corpo carnudo resumiam-se a inclinações dos olhos vermelhos que agora testemunhavam o soterramento de uma comunidade de tatuís.

A lua cheia mirou intrigada a imersão das coxas enquanto o oceano, faminto, lambia as dobras da bunda voluptuosa de Marina. Um carangueijo que passava por ali estranhou a estagnação apática da moça e decidiu provocá-la, investindo bruscamente na direção dos mamilos pontudos, como se ameaçasse beliscá-los com suas mãos de alicate. Nenhuma reação. O carangueijo deixou-se levar por uma marola e flutuou magoado. Sentia-se imprestável, invisível.

Marina já podia sentir a areia entre os dentes quando o odor de peixe, água e sal penetrou suas narinas e enviou a mensagem de transe para as profundezas do cérebro. Quando amanheceu, a praia estava deserta.

Zé McGill


* Um vídeo amador do incrível Shuggie Otis! A música chama-se Aht uh mi hed. Confira:




3 comentários:

p. disse...

e ae primo zé , li e gostei desse conto e também das outras paradas escritas na pag. vou adicionar ae a revista foda-se no p.p.m!

ta linkado!

Anônimo disse...

Sem graca, perdi a fe em vc, td mt interessante ate chegar nesse conto de merda

Revista Foda-se disse...

Huahuau!
Obrigado.
e... foda-se...