quinta-feira, 7 de agosto de 2008

O CAVALO DA TECNOLOGIA


Acho um saco esse papo de tecnologia. Pra mim, bluetooth é cárie, banda larga é bunda grande e firewall é assunto para o corpo de bombeiros. Mas, além de me entediar, a tecnologia me assusta. Ela está tornando o ser humano cada vez mais superficial e individualista. A criança contemporânea brinca cada vez menos na rua e passa cada vez mais tempo com a cara grudada na tela do computador. Pessoas constroem relações de amizade e amor através de cabos de fibra ótica, muitas vezes sem sequer terem trocado um olhar. Fico me perguntando aonde isso tudo vai parar, mesmo sabendo que isso tudo não vai parar.

Evoluir é uma necessidade natural do homem? Ok, pode ser. Mas o homem também tem bom senso e sensibilidade, ou não? Está na moda militar contra o aquecimento global e a poluição, o que é ótimo (e vital), mas ninguém parece perceber as ameaças do avanço desembestado da tecnologia. Quando a poluição começa a ameaçar a saúde, eles não criam o rodízio de automóveis, os filtros de chaminés? Pois então, por que não utilizar o bom senso para decretar uma freada na corrida alucinada do cavalo da tecnologia? É, eu vejo a tecnologia como um cavalo raivoso de olhos vermelhos esbugalhados que cavalga espumando pelos cantos da boca, soltando fumaça pela narina e atropelando tudo que cruza o seu caminho.

Por outro lado, reconheço que alguns dos avanços tecnológicos proporcionam coisas boas. Sem eles, não existiriam o MP3, nem as redes de P2P (troca de arquivos digitais) – a melhor invenção dos últimos anos. Não existiriam o Youtube, o rádio, os amplificadores, as guitarras, o cinema, as transmissões ao vivo de futebol pela TV. Sei de tudo isso. E sei também que não existiria este blog. Talvez a Revista Foda-se nunca tivesse nascido. Mas quando penso na clonagem de animais e seres humanos, no culto à música eletrônica movido a drogas sintéticas, na indústria bélica, na bomba atômica, na mira laser, no Big Brother em que as metrópoles monitoradas por câmeras estão se tornando e na Cora Rónai (a colunista nerd de O Globo), sinto que a coisa está fora de controle. Deu tilt no sistema.

Alguém dirá que a tecnologia não tem culpa, que o culpado é sempre o homem, que a utiliza de forma mesquinha e egoísta. Eu discordo. Acho que, assim como o dinheiro, a tecnologia pode ter vida e alma próprias. E, assim como o dinheiro, ela pode sim influenciar o comportamento do ser humano. Pode mudar conceitos, transformar tradições e culturas, criar vícios nocivos. E pode até contribuir com o fim de namoros e casamentos. É impressionante o número de casais desfeitos com a ajuda da Internet. Conheço vários casos de relacionamentos que terminaram com a descoberta de um e-mail ou de uma mensagem suspeita no Orkut. É cada vez mais comum.

A nossa geração, e as próximas duas ou três, poderiam viver muito bem com o que temos hoje, sem que nada mais fosse inventado. E poderia viver melhor ainda se algumas invenções recentes fossem eliminadas do nosso dia-a-dia. Não digo isso com o ressentimento de um ancião que perdeu o seu posto de trabalho para uma máquina, ou coisa que o valha. Trabalhei durante cinco anos na área de teconologia dentro de gravadoras. Fui responsável pelos sites e pelos novos negócios que envolvem a música. Acompanhei de perto a queda da venda de CDs e o surgimento das mídias digitais, da venda de arquivos de música através da Internet e dos telefones celulares. E encho a boca pra dizer: pedi demissão porque, entre outros motivos, este negócio perdeu a graça. Pelo menos para mim.

O negócio das gravadoras perdeu a graça porque a tecnologia acabou com o tesão do consumidor pelo ato da compra de música. Durante boa parte da minha vida, um dos maiores prazeres que tinha era entrar numa loja de discos, olhar as prateleiras cheias de vinis ou CDs, pegar um disco nas mãos e admirar a capa. Depois, era levar o disco pra casa, colocá-lo para tocar e ler o encarte com as letras e a ficha técnica. Isso tudo criava um clima que não se cria mais com as lojas de música digital na Internet ou nos telefones celulares. Hoje, o processo é frio demais. Automático demais.

Até o sexo está ficando automático. Nunca se bateu tanta punheta no planeta Terra quanto após o advento da Internet. Antigamente, a masturbação era patrocinada pela imaginação ou pelas fotos de revistas. Hoje, todo mundo faz sexo com a tela do computador. Taxistas, atletas, porteiros, maquiadores, executivos, presidentes. Todos têm o seu site de sacanagem predileto. O seu chefe também. Seu filho idem. Até a sua mãe vê putaria na rede! E, a princípio, não há nada de errado com isso. Mas a coisa pode ficar perigosa, porque nunca foi tão fácil se viciar em masturbação.

A ganância, a ira, a inveja, o ciúme, a perversão, a violência e outras maravilhas tão antigas quanto estas nunca estiveram tão bem acompanhadas. O dinheiro e o cavalo da tecnologia estão prontos para equipá-las. Outro dia me disseram que eu tenho alma de hippie. Talvez seja verdade, mas podem anotar aí: o dinheiro e o cavalo da tecnologia serão responsáveis pelo fim da humanidade.

Zé McGill



* Como prova de nosso apreço pelas coisas boas proporcionadas pela tecnologia, a partir de agora, toda postagem da Revista Foda-se terá um vídeo de música do Youtube. O escolhido da semana é o clipe da música Jailer, da cantora franco-nigeriana Asa. Clique no link abaixo.
http://www.youtube.com/watch?v=Sh2vqnok1OA

3 comentários:

Anônimo disse...

O problema é o bicho homem e não o "cavalo".
Saudades imensas!
Carla O

Anônimo disse...

Dantas, tem que atualizar essa casseta!

Anônimo disse...

Esqueci de assinar:

Miguel